ChatGPT na orientação e mobilidade – Uma breve análise
Vira e mexe circula em grupos de Whatsapp algum vídeo sobre uma tecnologia “milagrosa” que vai ajudar a resolver muitos problemas, não é mesmo?
E não foi diferente com um vídeo que vimos sobre uma pessoa com deficiência visual que está testando o desempenho do ChatGPT para obstáculos e outras coisas.
Assim como no texto A “utilidade pública” que sai pela culatra! onde analisamos a sugestão de uma “influencer” sobre a maneira que ela julga ser adequada uma pessoa cega solicitar ajuda no ponto de ônibus, aqui vamos analisar uma pessoa cega que está andando na rua e testando as informações fornecidas pela Inteligência Artificial (IA).
O vídeo inicia com o rapaz solicitando ajuda para sua caminhada em uma rua em Criciúma/SC. Ele se desloca com a bengala longa em uma mão e o celular levantado com a câmera apontada para a frente na outra mão.
O rapaz cego precisa interagir com a IA o tempo inteiro, perguntando: “O que está na minha frente?”; “Desvio para qual lado?”; “Estou próximo da esquina?”, ou seja, a descrição das imagens obtidas pela câmera não são feitas de forma automática pela IA.
Algumas imprecisões no uso da Inteligência Artificial e a importância da bengala longa
No percurso, verificamos alguns pontos de atenção, como por exemplo, quando ele se aproxima de uma mureta com alguns carrinhos de supermercado atrás e a IA identifica somente os carrinhos, ignorando a mureta.

Em outras situações, ela sugere o desvio de obstáculos para o lado errado. Mais a frente vimos, também, que a IA não identificou degraus na calçada.
Nestas situações, percebe-se, claramente, que se o rapaz não conhecesse o percurso e se a bengala longa não antecipasse estes obstáculos e desníveis, ele poderia se acidentar e machucar.
A Inteligência Artificial como uma parceira na descrição dos ambientes
Uma coisa que funcionou bem é a descrição de algumas informações do ambiente. No vídeo, vemos que, a partir de esquinas, o rapaz solicita informações sobre o que há do outro lado da rua. Aí sim, fica legal, porque a IA identifica uma academia e, mais à frente, em outra esquina, um prédio bege com algumas plantas.

Ela ainda foi capaz de descrever a fachada de vidro da academia, outras vitrines de lojas, faixa de pedestres, o que havia à esquerda e à direita (mesmo do outro lado da rua) e a placa com o nome da rua. Mas, atenção, somente quando perguntada e com a câmera do celular apontada na direção correta.
A necessidade de interação com outras pessoas e o piso tátil sem função
Para atravessar algumas ruas, o rapaz pergunta sobre a presença de um semáforo e diante da resposta de que não há semáforos, fica aguardando a ajuda de alguém ou atravessa sozinho. Em outra situação é ajudado por uma senhora, que sinaliza um degrau na calçada (que a IA não identificou como obstáculo/perigo).
É curioso verificar que, durante todo o percurso, nós vimos o piso tátil direcional. O piso tátil, quando bem instalado e utilizado, é um caminho seguro e ajuda a detectar as esquinas e possíveis perigos. Porém, ali no centro de Criciúma, estão fora das recomendações técnicas, oferecendo, na maior parte do percurso, pouco contraste tátil com o piso adjacente.

Considerações finais para refletir e não concluir
- Foi bem interessante a ideia do rapaz utilizar o aplicativo para ajudar na sua mobilidade;
- Andar com um celular na mão tão exposto não é uma ideia segura;
- A necessidade de ficar fazendo perguntas uma boa parte do tempo, não pareceu funcional. Prestar atenção no celular, pode “distrair” a pessoa cega para outras informações pertinentes do ambiente e até causar acidentes;
- A confusão entre esquerda e direita, no desvio de obstáculos, assim como a não identificação da mureta e do degrau na calçada são situações que colocam a integridade física da pessoa em perigo;
- A identificação dos ambientes a partir da leitura da paisagem, de placas de rua e outros letreiros disponíveis foi muito legal;
Toda tecnologia é bem-vinda, mas depende do contexto onde é utilizada. No Brasil, onde há muito a ser feito em termos de acessibilidade e a desigualdade social é um grande problema, aprender e utilizar determinadas tecnologias, principalmente expostas na rua, não é tarefa simples.
Abaixo, disponibilizamos o vídeo completo e agradecemos ao canal Tecnologia e Acessibilidade pela experiência. Valeu, Francis!
Para finalizar, seguimos acreditando na colaboração como um caminho de evolução e na educação, como diz Paulo Freire, como um ato de amor e coragem.
Experimente o aplicativo em ChatGPT
Fonte: OMDHA
Olá pessoal do OMDHA. Tudo bem?
Já havia visto este vídeo no meu WhatsApp. A ideia de usar uma ferramenta de IA como auxílio na OM é bem interessante.
Mas conforme foi citado no texto, ficar com o celular o tempo todo exposto, não é de maneira nenhuma segura em se tratando de Brasil.
Mas já há protótipos de óculos inteligentes com IAs embarcadas e o próximo passo seria uma IA com foco em OM.
Olá, Ricardo
Agradecemos pela leitura e comentários. Sua opinião é importante para nós, afinal, você é um expert da tecnologia assistiva.
Ótimo artigo.
Eu, Francis Guimarães, pessoa cega, fui quem gravou o vídeo testando o reconhecimento de imagens em tempo real do ChatGPT.
A ideia do vídeo, de forma alguma, era incentivar outras pessoas a utilizarem ou não o recurso, mas sim mostrar as possibilidades maravilhosas que têm surgido e evoluído em um curto espaço de tempo.
Embora eu jamais tenha falado no vídeo, ou em qualquer outro local, sobre tecnologias milagrosas que resolvem os problemas da falta de acessibilidade, talvez tenha, erroneamente, passado essa ideia para algumas pessoas.
De maneira alguma acredito que a inteligência artificial, ou qualquer outro recurso tecnológico, irá substituir as técnicas de orientação e mobilidade através da bengala longa, somadas ao desenvolvimento das nossas percepções e ao uso do tato e da audição para nos deslocarmos nas ruas.
Lamentavelmente, o Brasil é, sem dúvida, um país extremamente perigoso, onde não é aconselhável andar com o celular na mão em grandes centros urbanos. Mas nem por isso acredito que devamos deixar de utilizar os recursos existentes.
Encerro agradecendo muito a quem elaborou este texto, trazendo os pontos positivos e negativos do teste que realizei.
A inteligência artificial não faz com que eu me locomova melhor ou pior pelas ruas ou em espaços internos.
Mas, em momentos de necessidade, quando estou em ambientes onde não conto com o auxílio de pessoas videntes, puxo o smartphone do bolso, aciono o ChatGPT e peço para que leia placas, reconheça lojas, bem como portas de corredores de prédios.
Entendo que a tecnologia é uma potente aliada, que não substitui, de forma alguma, os recursos já existentes.
Olá, Francis
Muito obrigada por ler e comentar. Agradecemos sua identificação, assim fica registrada a autoria do video. Sua experiência nos ajudou a impulsionar esta discussão.
Tamojunto